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8.30.2009
Jobim contra o AC
8.23.2009
A volta da Engesa
Claudio Dantas Sequeira
ÍCONE DE GUERRA O Urutu em ação: principal produto da empresa
No dia 7 de setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu convidado, Nicolas Sarkozy, da França, terão um motivo a mais para comemorar. Além de assinarem o contrato de fornecimento dos 51 helicópteros de transporte militar EC-725, lançarão a pedra fundamental da "Engesaer", holding que tomará a frente das iniciativas de transferência de tecnologia no âmbito da Estratégia de Defesa Nacional. A marca Engesa fez história no País entre as décadas de 70 e 80, quando figurou como importante indústria de material bélico, exportando caminhões militares e blindados leves para 18 países.
Espera-se reeditar o sucesso da época e levar o Brasil de volta ao seleto grupo de fabricantes de armamentos. No comando da iniciativa está o coronel reformado Oswaldo Oliva Neto, irmão do senador Aloizio Mercadante (PT-SP) e ex-assessor do ex-ministro Luiz Gushiken, quando esteve à frente do Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE) da
Presidência, depois transformado em Ministério.
Íntimo do poder e dos militares que comandam a indústria de defesa nacional, Oliva Neto vem trabalhando há quase um ano nos bastidores para a concretização do projeto. Nos últimos meses, ele manteve encontros privados com os comandantes das Forças Armadas e representantes do Ministério de Desenvolvimento, da Defesa e do BNDES.
Mas o tema é coberto de sigilo, e cláusulas de confidencialidade do acordo impedem que Oliva Neto e a EADS, o detalhem.
Professor do Núcleo de Estudos Estratégicos da Unicamp, o coronel reformado Geraldo Cavagnari avalia que a reedição da marca Engesa faz parte das ações para "revitalizar a indústria de defesa brasileira e ingressar em níveis tecnológicos mais elevados". Cavagnari lembra que a Engesa construiu um mercado amplo e chegou a exportar para a África e o Oriente Médio, como os casos de Angola, Líbia e Iraque. Embora seus produtos mais conhecidos sejam os blindados Urutu e Cascavel, a
Engesa se transformou num poderoso grupo que produziu desde tratores agrícolas até radares. Foi à falência em 1993, vitimada por problemas financeiros que tiveram origem na má gestão da companhia, segundo Reinaldo Bacchi, ex-gerente de marketing e produtos militares da Engesa. "Tem gente que inventa história de calote iraquiano, mas isso
nunca existiu. Quem ficou devendo foi a Engesa." Segundo o advogado Maicel Anésio Titto, que cuidou do espólio, há poucos anos o registro da marca caducou, permitindo sua apropriação por terceiros.
Segundo Oliva Neto, a ideia de criar a Engesaer surgiu tanto da demanda nacional pela reativação da indústria bélica como da necessidade do próprio grupo EADS de negociar a transferência de tecnologia do contrato dos helicópteros, estimado em US$ 6 bilhões. Havia desconforto dos europeus em lidar pontualmente com várias pequenas empresas, sem a garantia de que os parceiros teriam condições econômicas e tecnológicas que justificassem a desmobilização de fornecedores na Europa. Numa cadeia produtiva, com tamanho grau de integração, qualquer falha na produção pode ter consequências desastrosas. "Com a holding, as desconfianças são dissipadas, uma vez
que os investidores europeus terão a oportunidade de acompanhar o dia a dia das companhias que receberão a nova tecnologia", afirma Oliva Neto. "Além de profissionalizar o setor, o desenvolvimento de massa crítica e a instalação de capacidade produtiva, ampliam as possibilidades da Engesaer muito além do projeto dos helicópteros." A EADS já está enviando especialistas da unidade de negócios e engenheiros para visitar as empresas brasileiras e avaliar a capacidade de produção de bens e serviços. O objetivo é estimar como o Brasil participará na escala mundial do grupo.
A Engesaer representa a criação no Brasil de uma plataforma segura para a nova estratégia de negócios do grupo europeu, que prevê levar para fora da zona do euro até 40% de toda sua produção, a fim de reduzir custos com a obtenção de isenções fiscais e mão de obra mais barata. Essa lógica já vem sendo adotada no contrato dos helicópteros, que prevê a nacionalização de 50% da produção. É possível que o EC-725 seja produzido integralmente na fábrica da Helibrás, com vistas à exportação. Pensando nisso, a EADS adquiriu recentemente, por meio do consórcio Eurocopter, 70% da companhia brasileira. No caso da Engesaer, a participação acionária do grupo europeu estará limitada a 20%, para evitar que o negócio seja visto como "invasão estrangeira".
O restante será aberto a investidores nacionais, como fundos de pensão. O governo federal, por sua vez, terá uma golden share, como ocorre com a Embraer, a fim de exercer o controle estratégico das operações.
Inicialmente, a Engesaer aproveitará a capacidade instalada de, ao menos, cinco empresas do setor de defesa: Imbra Aerospace e Mectron Engenharia, Akaer, Atmos e Gigacom, cujos presidentes coordenarão diferentes núcleos de negócios, como engenharia, aeroestrutura, sistema de armas e comunicação. Com esse modelo de produção, uma empresa torna-se fornecedora da outra, eliminando a verticalização do imposto.
Além de helicópteros, a holding também construirá satélites de controle de tráfego aéreo e sistemas para a área de segurança pública.
Para o consultor em segurança nacional Salvador GhelfiRaza, do Centro de Estudos Hemisféricos de Defesa, braço acadêmico do Pentágono, a estratégia da EADS segue a tendência internacional. "O modelo de negócio é correto, mas o Brasil não está preparado", afirma Raza.
Segundo ele, há barreiras tecnológicas, financeiras e de legislação que podem dificultar o sucesso do negócio.
8.19.2009
Catilina abusa de nossa paciência
Calígula, desgostoso com o Senado, nomearia senador seu cavalo Incitatus, com direito a 18 assessores e um colar de pedras preciosas
"ATÉ QUANDO , ó Catilina, abusarás da nossa paciência?", indagou Marco Túlio Cícero ao senador Lúcio Sérgio Catilina, a 8 de novembro de 63 a.C., em Roma. Flagrado em atitudes criminosas, Catilina se recusa a renunciar ao mandato.
Jurista, Cícero se esforçou para que Catilina admitisse os seus graves erros: "É tempo, acredita-me, de mudares essas disposições; desiste das chacinas e dos incêndios. Estás apanhado por todos os lados. Todos os teus planos são para nós mais claros que a luz do dia".
Se Catilina permanecia no Senado, não era apenas a vontade própria que o sustentava, mas sobretudo a cumplicidade dos que teriam a perder, com a renúncia dele, proveitos políticos. Daí a exclamação de Cícero: "Em que país do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso?".
Cícero não temia ameaças e expressava o que lhe ditava o decoro: "Já não podes conviver por mais tempo conosco; não o suporto, não o tolero, não o consinto. (...) Que nódoa de escândalos familiares não foi gravada a fogo na tua vida? Que ignomínia de vida particular não anda ligada à tua reputação? (...) Refiro-me a fatos que dizem respeito não à infâmia pessoal dos teus vícios, não à tua penúria doméstica e à tua má fama, mas sim aos superiores interesses do Estado e à vida e segurança de todos nós".
Os crimes de Catilina escancaravam-se à nação. Seus próprios pares o evitavam, como assinalou Cícero: "E agora, que vida é essa que levas? Desejo neste momento falar-te de modo que se veja que não sou movido pelo rancor, que eu te deveria ter, mas por uma compaixão que tu em nada mereces. Entraste há pouco neste Senado. Quem, dentre esta tão vasta assembleia, dentre todos os teus amigos e parentes, te saudou? Se isso, desde que há memória dos homens, a ninguém aconteceu, ainda esperas que te insultem com palavras quando te encontras esmagado pela pesadíssima condenação do silêncio?".
Catilina fingia não se dar conta da gravidade da situação. Fazia ouvidos moucos, jurava inocência, agarrava-se doentiamente a seu mandato.
"Se os meus escravos me temessem da maneira que todos os teus concidadãos te receiam", bradou Cícero, "eu, por Hércules, sentir-me-ia compelido a deixar a minha casa; e tu, a esta cidade, não pensas que é teu dever abandoná-la? E se eu me visse, ainda que injustamente, tão gravemente suspeito e detestado pelos meus concidadãos, preferiria ficar privado da sua vista a ser alvo do olhar hostil de toda a gente; e tu, apesar de reconheceres, pela consciência que tens dos teus crimes, que é justo e de há muito merecido o ódio que todos nutrem por ti, estás a hesitar em fugir da vista e da presença de todos aqueles a quem tu atinges na alma e no coração?"
Cícero não demonstrava esperança de que seu libelo fosse ouvido: "Mas de que servem as minhas palavras? A ti, como pode alguma coisa fazer-te dobrar? Tu, como poderás algum dia corrigir-te?". E não poupou os políticos que, apesar de tudo, apoiavam Catilina: "Há, todavia, nesta ordem de senadores, alguns que ou não veem aquilo que nos ameaça ou fingem ignorar aquilo que veem".
Acuado, Catilina se refugiou na Etrúria e morreu em 62 a.C. Cícero, afastado do Senado por Júlio César, foi assassinado em 43 a.C. Um século depois, Calígula, desgostoso com o Senado, nomearia senador seu cavalo Incitatus, com direito a 18 assessores, um colar de pedras preciosas, mantas de cor púrpura e uma estátua, em tamanho real, de mármore com pedestal em marfim.
8.16.2009
Militares, nunca mais ! (Millôr Fernandes)
8.13.2009
Resenha
Visão militar
Míriam Leitão
O Exército se sente ameaçado pela presença de bases americanas na Colômbia? Um general me disse que não. Acha que os americanos deveriam ter nos informado previamente, mas lembrou, pragmático: "Entre as bases na Colômbia e o nosso território tem a selva. Não dá para as tropas se movimentarem por terra. Para isso, eles têm porta-aviões, bombardeiros que reabastecem no ar e supremacia aérea."
Hoje o Brasil tem 53 militares, de patentes diferenciadas, treinando em escolas americanas como West Point. Há uma longa tradição de cooperação. Ainda que mantendo-se a necessária distância. Visitas militares americanas, inclusive de oficiais de alta patente, têm sido mais frequentes.
- A gente sente que eles querem agradar, mas são meio atrapalhados. Não vejo qualquer ameaça militar americana ao Brasil nem direta, nem indireta - disse.
Há pouco mais de um mês houve uma competição das forças especiais de 21 países latino-americanos. É uma competição tradicional, sempre organizada, financiada e arbitrada pelos Estados Unidos. É uma espécie de competição de esportes radicais. O ganhador é sempre a Colômbia cujo Exército é treinado pelos americanos.
Desta vez, foi um pouco diferente. Nossas Forças Armadas disseram que como era em solo brasileiro, a competição seria organizada e arbitrada por brasileiros. Aceitaram apenas o financiamento americano. Quem ganhou foi o Brasil. O segundo lugar, surpreendentemente, foi do Equador, e a Colômbia veio em terceiro.
Ou seja, há espaço para visitas, intercâmbio e até olimpíadas militares entre os países da região. Nada lembra um clima belicoso. Para o general, o mal-estar agora foi causado por uma incapacidade americana de entender quais são os sentimentos e reações dos países latino-americanos em relação a eles.
Até por confusões históricas, o governo americano deveria ter consultado os países da região. Na visão do general, a tensão é causada mais por Hugo Chávez e ela pode vir a ser uma ameaça para o Brasil mais adiante.
- Ele hoje já controla o governo dele, da Bolívia, do Equador, tem influência na Argentina e Paraguai. No Peru, onde seu candidato Ollanta Humala perdeu no photochart, o presidente Alan Garcia está com baixíssima popularidade. Chávez jogará todo o dinheiro possível para controlar o governo de Lima. Quando acontecer isso ele completa seu arco bolivariano. Enquanto o governo brasileiro fizer tudo o que ele quer, fica tudo bem. Mas no futuro pode haver tensão entre nós. Eles têm força econômica, saída para o Pacífico, Atlântico, Caribe e um governo que gosta de confrontos. Nosso problema não é militar com os Estados Unidos, é de geopolítica da região - disse o general.
Para o militar, não há qualquer ameaça dos americanos sobre o território brasileiro. Na avaliação que faz, os americanos perderam a base de Manta no Equador, perderam a presença na Bolívia, onde a DEA (departamento de combate às drogas) trabalhava livremente. Além disso, não têm tido tanto sucesso assim na Colômbia:
- As Farc estão mais enfraquecidas, mas o tráfico não teve queda sensível. Os americanos já estão na Colômbia há muito tempo e todo mundo sabe.
Ontem, Hugo Chávez escalou e falou que as bases americanas na Colômbia podem detonar uma guerra na América do Sul. É claro, pura retórica. Ele gosta de manter esse clima de beligerância no qual cresce, aparece, e foge do desgaste provocado pelas crises política e econômica.
Nesta situação, cabe ao Brasil manter seu tradicional equilíbrio com o qual vem se mantendo em paz por mais de um século com os países do continente. O que deveria ser evitado é tomar satisfação da Colômbia e ser condescendente com a Venezuela. É achar normal que a Venezuela faça exercícios com a esquadra russa, mas tratar o acordo militar dos Estados Unidos com a Colômbia como um risco iminente de invasão do território brasileiro.
Quando veio a esquadra russa, circularam rumores de que o presidente Lula não gostou, mas oficialmente o Brasil não disse que os russos aqui, em águas venezuelanas, lembravam a guerra fria. Hugo Chávez criticou quem pensasse nisso. "Este é um velho plano. Trataram de especular que é a nova Guerra Fria, toda uma manipulação, isso não é nenhuma provocação, é um intercâmbio entre dois países livres e soberanos", disse Chávez na noite da chegada dos navios russos. No fim, os dois países assinaram um acordo para a construção de uma usina nuclear na Venezuela.
O semi-ministro das relações exteriores do Brasil, Marco Aurélio Garcia, disse sobre as bases americanas na Colômbia que cachorro mordido por cobra tem medo de linguiça. A expressão é engraçada, mas não traduz o clima no país, nem nas relações com os Estados Unidos. O Brasil não é uma republiqueta ameaçada, é um país soberano, que saberá manter essa posição. Não precisa tremer diante de qualquer coisa, nem deixar que o rabo balance o cachorro, como, por exemplo, aceitando que Chávez dê o tom da nossa atitude diplomática, na relação com o nosso maior parceiro comercial e país do qual recebemos o maior volume de investimentos.
Gilmar compara Senado em crise à Bolívia
'Presidentes não terminam mandato'
Fábio Fabrini
BELO HORIZONTE. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, comparou ontem as crises no Senado, que ameaçam a permanência de José Sarney (PMDB-AP) na presidência da Casa e, em 2007, afastaram do cargo Renan Calheiros (PMDB-AL), à instabilidade política no país mais pobre da América do Sul, a Bolívia.
- Já há algum tempo, o Senado não encontra meios de um funcionamento regular. Está parecendo a Bolívia: os presidentes não terminam mandato ou ficam ameaçados de perda do mandato - afirmou, após palestra a secretários de Segurança Pública, na capital mineira.
EUA ofertam apoio técnico caso jato vença licitação
BRASÍLIA. A secretária de Estado da Casa Branca, Hillary Clinton, enviou carta ao governo brasileiro afirmando que os Estados Unidos vão oferecer cooperação tecnológica, se os caças F-18 vencerem a disputa para o fornecimento de aeronaves à Força Aérea Brasileira (FAB). O gesto é mais uma tentativa de garantir apoio na reta final do projeto FX-2. O relatório técnico da Aeronáutica servirá de subsídio para a escolha do governo. Além do jato americano, estão na corrida o Rafale (França) e o Gripen NG (Suécia). A carta de Hillary foi entregue ontem ao ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, pelo subsecretário de Defesa para Aquisição de Tecnologia e Logística dos Estados Unidos, Ashton Carter.
Temor entre os internos do Colégio Naval
Um grupo de 42 alunos do Colégio Naval, em Angra, que apresentou sintomas de gripe comum com estado febril ao retornar às aulas na segunda-feira, teve que voltar para a casa com a orientação de que, caso os sintomas persistissem e houvesse piora do quadro clínico, os estudantes deveriam procurar atendimento no Hospital Naval Marcílio Dias. De acordo com o Comando do 1º Distrito Naval, não houve nenhum diagnóstico preliminar de caso de gripe suína e não há intenção de as aulas serem suspensas.
Segundo o comando, o colégio está cumprindo o protocolo do Ministério da Saúde. Dos alunos que se sentiram mal, 14 já cumpriram o período de dez dias de manifestação da gripe e retornarão às atividades normais até o fim desta semana.
O Colégio Naval tem 633 alunos no ensino médio. Todos moram na unidade e, segundo o departamento de relações públicas da escola, devido a este sistema fica mais fácil controlar o estado de saúde dos estudantes, que não podem sair da unidade durante a semana.
Lula tenta levar Uribe à reunião da Unasul
Os dois presidentes tratarão da crise hoje, em encontro em Brasília
BRASÍLIA. A preocupação brasileira com o acordo militar também será transmitida ao presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, que estará hoje em Brasília, onde se encontrará com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além de pedir esclarecimentos e mais transparência em torno do acordo militar, Lula discutirá a crise com a Venezuela e tentará convencer Uribe a participar da cúpula de chefes de Estado da União Sul-Americana de Nações (Unasul) na semana que vem, em Quito, no Equador.
Em uma clara referência a seu desafeto, o presidente equatoriano, Rafael Correa, o líder colombiano disse recentemente que a Unasul pode morrer sob a presidência do Equador. Uribe, aliás, sempre se posicionou contra a criação do Conselho de Defesa da região e não pretende comparecer à convocação.
Estatuto dos índios chega ao Congresso
Jornal do Brasil
BRASÍLIA - O ministro da Justiça, Tarso Genro, entregou ontem ao presidente da Câmara, Michel Temer, a nova proposta de Estatuto dos Povos Indígenas. O projeto foi discutido ao longo dos dois últimos anos com comunidades indígenas de várias regiões do País. Atualmente, há na Câmara uma proposta de Estatuto das Sociedades Indígenas - o Projeto de Lei 2057/91. A tramitação dessa proposta está paralisada desde 1994.
Genro afirmou que a nova proposta acaba com todo resquício de tutela e outorga plena capacidade civil aos indígenas, sem prejudicar, no entanto, as especificidades culturais. Ele destacou que a proposta vai modernizar a atual legislação. O estatuto vai normatizar direitos e obrigações em áreas como demarcação de terras, uso de recursos florestais, proteção ambiental, saúde, educação, atividades produtivas, além de normas penais e punições para crimes contra índios.
Cessão de bases colombianas pode virar guerra, diz Chávez
CARACAS - Depois de conseguir desviar atenção da polêmica sobre a compra de armas suecas pelo Exército venezuelano que teriam ido parar na mão das Farc para a cessão de bases pela Colômbia a tropas dos Estados Unidos, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, aumentou o tom de ameaça e disse que o aumento de tropas americanas nas bases colombianas pode ser um passo em direção à guerra na América do Sul.
Chávez, que havia colocado suas tropas em alerta durante disputas diplomáticas com a Colômbia mas recuou, acrescentou que seu governo planeja a compra de dezenas de tanques, já que seu país se sente ameaçado pelo acordo levado adiante pelo presidente colombiano, Álvaro Uribe.
8.12.2009
OAB questiona no STF lei do Mandado de Segurança sancionada por Lula
8.09.2009
Ação popular é instrumento de controle social de agentes públicos
A ação popular é uma das mais antigas formas de participação dos cidadãos nos negócios públicos, na defesa da sociedade e de seus valores. Atualmente, conta com previsão constitucional e é regulada pela Lei n. 4.717, de 1965. A ação materializa direito político fundamental, caracterizado como instrumento de garantia da oportunidade de qualquer cidadão fiscalizar atos praticados pelos governantes, de modo a poder impugnar qualquer medida tomada que cause danos à sociedade como um todo. Em seus julgamentos, o Superior Tribunal de Justiça prestigia esse relevante instrumento de exercício da cidadania. Conheça alguns aspectos dessa ação, ainda pouco presente no cotidiano da Corte. Notícia completa em: Consultor Jurídico
8.02.2009
Comandos vão redistribuir tropas
De Brasília
As Forças Armadas preparam uma redistribuição espacial de suas tropas. O Comando da Aeronáutica resolveu abrir, nos próximos anos, sua primeira base permanente na região Norte. Será em Manaus e terá uma frota de caças F-5, modernizados pela Embraer, para dar combate imediato a qualquer ameaça em território amazônico. No comando da Infraero até agosto, o tenente-brigadeiro Cleonilson Nicácio da Silva acaba de concluir uma espécie de "permuta" com a FAB.
Em troca de um terreno para a expansão do aeroporto de Florianópolis, cederá áreas no aeroporto de Manaus para a construção da nova unidade militar. Uma segunda pista de pouso e decolagem, a ser construída em cerca de quatro anos, servirá tanto à aviação comercial quanto os caças, informou Nicácio, que assume no mês que vem o Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA), em São José dos Campos, um dos principais postos da Aeronáutica. O brigadeiro deverá ser substituído por Murilo Barbosa, chefe de gabinete do ministro da Defesa, Nelson Jobim.
O Exército, no documento "Estratégia Braço Forte", detalha os seus planos de redistribuição. Foram criados dois programas - Amazônia Protegida e Sentinela da Pátria - , que aumentarão o contingente de soldados e oficiais. O primeiro programa visa fortalecer a presença militar terrestre na região e ampliar a vigilância e o monitoramento das fronteiras amazônicas. Serão implementados 28 novos pelotões especiais de fronteira. Eles se somarão aos 21 existentes, que passarão por uma modernização.
O programa Sentinela da Pátria prevê o reforço das estruturas operacional e logística dos comandos militares de área. Inclui basicamente projetos relacionados à transferência, transformação e implantação de unidades. No curto prazo, até 2014, destacam-se os projetos em andamento de implantação da brigada de operações especiais em Goiânia, a transferência da 2ª brigada de infantaria de selva para São Gabriel da Cachoeira (AM) e a reestruturação da força de blindados.
No médio prazo, o programa contempla a transferência da brigada de infantaria Paraquedista para Anápolis (GO) e sua substituição, no Rio, por uma de infantaria leve. Haverá ainda criação de novas unidades de aviação (em Manaus e Campo Grande) e antiaérea (Brasília).
Na Marinha, as mudanças abrangem a criação de uma segunda esquadra e de uma divisão anfíbia no Norte/Nordeste, que também ganharão uma nova base naval. No geral, a Estratégia Nacional de Defesa sugere uma redistribuição territorial que permita o rápido deslocamento das tropas por todo o território brasileiro. A partir dos planos elaborados para cada um dos três comandos, o Ministério da Defesa proporá à Presidência da República um projeto de lei de equipamento e de articulação da Defesa Nacional. (DR)
AS APARENCIAS OFUSCANDO A VERDADE - UMA NAÇÃO QUE TAMBÉM LUTA PARA SALVAR-SE A SI MESMA
1. INTRODUÇÃO
A imagem de militares invadindo a casa de um presidente legitimamente eleito, sua detenção e imediata expulsão do país, reveste-se de todos os ingredientes de algo que, hoje em dia, causa forte repugnância na comunidade internacional. Difícil de explicar, quase impossível de justificar.
O quadro de um golpe de Estado patrocinado por militares está tão bem pintado, e reflete tão claramente, que se torna desnecessário, para muitos, fazer um esforço em ver a cena de outro ponto de vista, o que ofusca a verdade. Em nome dela, e por acreditar que realmente nem sempre os fatos falam por si mesmos, vou me atrever a mostrar esta mesma imagem desde outro ângulo.
Definitivamente, o que aconteceu em Honduras (e segue acontecendo) não guarda relação com o que se noticia na imprensa internacional. Se realmente conceitos tais como autodeterminação dos povos e soberania têm algum significado - e estão acima do pragmatismo que rege a relação entre os Estados - talvez valesse a pena o esforço em enxergar a cena descrita no primeiro parágrafo sob a ótica dos demais poderes do Estado de Honduras, de sua Constituição e, principalmente, da grande maioria do seu povo.
2. O GIRO À ESQUERDA DE ZELAYA
Eleito pelo tradicional Partido Liberal de Honduras, Manuel Zelaya assumiu a presidência em janeiro de 2006. O primeiro ano e meio de governo foi marcado por algumas medidas louváveis na esfera social e pela aproximação do mandatário com as classes menos favorecidas. Mesmo nesse período, já se falava da grande desorganização administrativa e do altíssimo grau de corrupção do seu governo, o que redundou em uma completa desestruturação das contas públicas.
A crise mundial de alimentos e o elevado preço alcançado pelo barril de petróleo colocaram o governo de Zelaya à beira de um colapso. Sua tábua de salvação não tardou a surgir. Para um país que tem 80% de sua matriz energética baseada no petróleo, a generosa oferta que Chávez lhe fazia, por meio da PETROCARIBE, era mesmo tentadora: petróleo garantido, pagamento de 50% no ato da compra e os outros 50% num prazo de 20 anos.
Da PETROCARIBE até a adesão à ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos da América) o caminho foi curto. Em 25 de agosto de 2008, pode-se dizer que começou uma segunda fase do governo Zelaya. Após forte resistência do Congresso Nacional, resistência essa vencida pela compra de consciências com petrodólares venezuelanos, Honduras tornou-se o mais novo membro do organismo de expansão do chamado “Socialismo do Século XXI”.
A partir de então, Chávez passou sua conta e ocorreu o que a imprensa denominou de “giro à esquerda”. Rompendo com o programa partidário que o elegeu, e para surpresa de muitos, Zelaya proclamou-se de esquerda. Adotou um discurso ofensivo contra o “imperialismo usurpador norte-americano”, trazendo pânico aos mais de 800.000 mil hondurenhos que vivem nos Estados Unidos e as suas famílias, que dependem das remessas para sobreviverem. Atacou sistematicamente o que chama de grupos de poder, numa referência às famílias que historicamente dominaram a política de Honduras, sem se importar com o fato de ele mesmo ser aparentado de uma delas.
3. OS PRIMEIROS PASSOS CONTRA UMA CONSTITUIÇÃO BLINDADA
No início de 2009, Zelaya lançou a idéia de um plebiscito, a fim de promover reformas na Constituição e perpetuar-se no poder, seguindo a mesma estratégia vitoriosa no Equador e na Bolívia, constante da cartilha de Chávez. Esse plebiscito passou a ser conhecido como “quarta urna”, numa referência às três outras já existentes nas eleições ordinárias, onde o povo vota em prefeitos, deputados e no presidente da República.
Para atingir seus objetivos, Zelaya implementou ações importantes. Em janeiro, visando a conquistar definitivamente a classe trabalhadora, numa medida claramente populista, que ignorou o delicado estado das finanças do país, majorou o salário mínimo em 60%.
Em fevereiro, efetuou mudanças em seu Gabinete. A mais importante delas consistiu na nomeação do Chanceler Edmundo Orellana Mercado, respeitado jurista e amigo de seu círculo mais íntimo, para a pasta da Defesa e sua substituição na chancelaria pela Sra. Patricia Rodas Baca, conhecida por suas posições de extrema esquerda e admiradora declarada de Chávez.
No âmbito das Forças Armadas, tomou uma medida inusitada ao ordenar a substituição do Comandante do Exército, General José Rosa Doblado Padilla, a pretexto de nomeá-lo embaixador em Israel. Sem margem a dúvidas, o General Doblado era a liderança militar de maior prestígio, pessoal e profissional, junto à tropa e junto à oficialidade, conhecido por sua retidão de caráter e apego às instituições. Certamente um obstáculo para as pretensões continuistas do presidente. Ainda hoje, o general aguarda em casa as providências para a sua acreditação junto ao governo israelense.
Logo Zelaya percebeu que a cartilha de Chávez não trazia soluções muito claras para um presidente desgastado, já nos seus últimos meses de mandato, imerso em denúncias de corrupção e de associação com o tráfico de drogas e com a influência diminuída pela definição dos dois principais candidatos às eleições presidenciais de novembro, Pepe Lobo e Elvin Santos, respectivamente candidatos pelo Partido Nacional e Liberal.
Também a cartilha chavista não apontava caminho para um impasse constitucional, característico das leis de Honduras, que ainda não havia se apresentado nas experiências anteriores. A Carta Magna de Honduras pode ser alterada em 97% dos seus 375 artigos pelo próprio Congresso Nacional.
Artigo 373: “A reforma da Constituição poderá decretar-se pelo Congresso Nacional, em sessão ordinária, com dois terços dos votos da totalidade dos seus membros”.
Existem, porém, algumas poucas cláusulas pétreas que não podem ser objetos nem mesmo de discussão, constituindo delito de traição à pátria o simples fato de propor sua revisão. A reeleição é uma delas. A Constituição de Honduras chega a ser redundante ao abordar o tema. Senão vejamos:
Artigo 374: “Não poderão ser reformados, em nenhum caso, o artigo anterior, os artigos constitucionais que se referem à forma de governo, território nacional,período presidencial, proibição para ser novamente presidente da república...” (grifo do autor)
Artigo 4: ...A alternabilidade no exercício da Presidência da República é obrigatória. A infração desta norma constitui delito de traição à Pátria. (grifo do autor)
Artigo 239: “O cidadão que tenha desempenhado a titularidade do Poder Executivo não poderá ser Presidente ou Designado. Aquele que ofender esta disposição ou propuser sua reforma, bem como aqueles que a apóiem direta ou indiretamente, terão cessado de imediato o desempenho de seus respectivos cargos e ficarão inabilitados por dez anos para o exercício de toda função pública”. (grifo do autor)
Aceito que tais artigos possam parecer pouco usual. Mas assim está definido por decisão soberana do povo hondurenho. Juridicamente, não há espaço para a convocação de uma Assembléia Constituinte. No caso de Honduras, a Constituição encontra-se blindada contra pretensões de continuismo, justamente como reação aos inumeráveis golpes de Estado e ditaduras pelas quais atravessou o país.
4. O DESENROLAR DA CRISE INSTITUCIONAL
Apesar dos cadeados constitucionais já assinalados, no dia 23 de março, em conselho de ministros, o presidente Zelaya emitiu o decreto Executivo PCM-005-2009, mediante o qual convocava uma consulta popular, cujo fim último era o estabelecimento de uma Assembléia Nacional Constituinte para formular uma nova Carta Magna, o que permitiria a eliminação de cláusulas pétreas.
Houve toda classe de reação contrária: o Colégio de Advogados de Honduras, Poder Judiciário, Ministério Público, Procuradoria Geral da República, Comissionado Nacional dos Direitos Humanos, Tribunal Superior Eleitoral, Comissão Nacional de Anticorrupção, Partidos Políticos, Igreja Católica, Igrejas evangélicas, Associação Nacional de Indústrias e Sociedade Civil.
A partir deste ponto, as opiniões se polarizaram e a crise institucional teve seus contornos delineados. De um lado, o presidente Zelaya e seus seguidores, mormente autoridades do governo, funcionários em cargos de confiança e organizações sindicais e campesinas que fomenta, custeia e orquestra em todo país, inclusive depondo suas estruturas dirigentes, quando o logra, ou criando entidades paralelas, quando nas existentes se mantêm diretorias que lhe são hostis.
De outra parte, começou a aglutinar-se uma ainda desestruturada oposição, abrangendo os dois candidatos às eleições presidenciais de novembro, personalidades civis, como o Arcebispo de Tegucigalpa, vários dos mais proeminentes líderes empresariais, magistrados de várias cortes, a promotoria pública, até advogados que teriam sido consultados pelos governistas, o ex-presidente Ricardo Maduro (a quem Zelaya sucedeu), órgãos influentes da imprensa, etc.
Em 08 de maio, o Ministério Público iniciou uma ação judicial ante o Tribunal de Letras do Contencioso Administrativo contra o Decreto Executivo de 23 de março. Em 20 de maio, a própria Procuradoria do Estado aderiu à dita iniciativa e posicionou-se contra as intenções de Zelaya.
Antes de o Tribunal revelar seu veredito, mais precisamente no dia 14 de maio, Zelaya preparou uma grande festa na Casa Presidencial para o lançamento oficial da "Frente Patriótica de Defesa da Consulta Popular e da Quarta Urna", “dentro do processo de convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte que elaborará a nova Constituição da República”. Na oportunidade, definiu-se a data da consulta, 28 de junho.
Para a cerimônia de anúncio foram convocados funcionários do governo até o terceiro nível, inclusive órgãos de administração indireta e autarquias. O comparecimento não foi apenas mandatório: cada pessoa convocada, obrigatoriamente, teria de trazer consigo outras três quaisquer. Mas nem tudo foi festa. Segundo observadores e comentaristas políticos, de certo modo foi uma demonstração de fraqueza do presidente Zelaya, posto que não conseguiu ali reunir qualquer liderança popular notoriamente importante.
Revelando considerável inabilidade no trato do assunto, o governo teve de reconhecer que mandara vir a Honduras o perito espanhol em matéria de direito constitucional Rubén Dalmau, que assessorou a Evo Morales e a Rafael Correa na elaboração das novas Constituições boliviana e equatoriana. Sua missão aqui, aconselhada por Chávez a Zelaya, seria a de preparar o projeto de uma nova Carta Magna que o Presidente apresentaria à Constituinte, “para facilitar e focalizar suas deliberações e expeditar o processo”.
O plano de Zelaya também previa o enfraquecimento das demais instituições do Estado. No referente ao Congresso, o governo buscou neutralizá-lo, enquanto não lograva sua completa reforma – “quem não votar pela quarta urna não será reeleito”, afirmava e reafirmava o presidente e seus porta-vozes.
O repasse de verbas ao Legislativo foi reduzido ao mínimo para pagar os salários de seus funcionários, dificultando o seu funcionamento normal. Mais que isto, a proposta de orçamento de 2009, que deveria ser enviada ao Congresso em setembro de 2008, nunca foi encaminhada para aprovação. Com essa manobra, Zelaya evitava a verificação pelos deputados do mau estado das contas públicas, com a receita em queda, como também impedia que os congressistas opinassem sobre a maneira com que o governo financiava suas atividades promocionais da “quarta urna”, graças a um dispositivo que lhe permitia aplicar o orçamento do ano anterior, enquanto o Legislativo não votasse o do ano em curso.
Apesar da crise que atingia Honduras impiedosamente, o governo gastava tudo que podia em vasta campanha midiática em prol da “quarta urna” e em atividades afins por todo o país (a comissão que investiga os gastos do governo deposto contabilizou um dado parcial de 40 milhões de dólares). Por outro lado, não foram repassados recursos de contrapartida para manter atividades de cooperação bilateral e multilateral, como afirmou o Representante Permanente da União Européia, publicando extensa matéria paga em nome do Grupo dos 16 (constituído por todos os principais países doadores a Honduras). Não foram repassados recursos para o Tribunal Superior Eleitoral começar a organizar as eleições de novembro, nem para o Registro Nacional das Pessoas (RNP), órgão a quem compete proceder ao registro dos eleitores. Muitos outros compromissos deixaram de ser honrados: cerca de um quinto dos municípios não receberam o repasse obrigatório de recursos. Ficou claro que os municípios não contemplados eram justamente aqueles cujos prefeitos não haviam se incorporado ao projeto de Zelaya.
5. A REAÇÃO DOS DEMAIS PODERES DO ESTADO
No dia 27 de maio, o Tribunal de Letras do Contencioso Administrativo suspendeu todos os efeitos do Decreto Executivo PCM-005- 2009, por haver sido considerado inconstitucional. Buscando manter a legalidade no país, o Tribunal proibiu qualquer tipo de publicidade a respeito do assunto e, antecipadamente, emitiu um parecer considerando ilegal qualquer outra iniciativa do governo dedicada à implantação de uma consulta popular que tenha por finalidade instalar uma Assembléia Constituinte.
Apesar da decisão judicial, Zelaya seguia obstinado e, em claro desafio ao Tribunal, ordenou que a publicidade relacionada à “quarta urna” não fosse interrompida nos meios oficiais de comunicação.
Pressionado de todos os lados, o governo admitiu a ilegalidade do Decreto Executivo PCM-005-2009. Resolveu, então, apresentar um novo decreto (que não foi publicado até as vésperas da consulta, para evitar novo posicionamento por parte do Judiciário) com os mesmos vícios constitucionais, o PCM-019-2009. Basicamente, o novo decreto apresentado trocou a palavra “consulta” por “pesquisa” popular.
A finalidade da nova disposição era igual ao da anulada, quer dizer, fazer uma consulta nacional para responder à seguinte questão: “Está você de acordo que nas eleições gerais de novembro de 2009 se instale uma quarta urna para decidir sobre a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte que emita uma Nova Constituição da República? Sim ou Não”, segundo o artigo 1°.
O artigo 2° instrui às distintas instituições do Estado, centralizadas e descentralizadas, para que executem ativamente todas as tarefas que lhes sejam encomendadas para a realização da pesquisa.
As Forças Armadas que, até então, mantinham-se afastadas do conflito político, viram-se atraídas para o campo de disputa, uma vez que receberam ordem explicita, também por meio de um decreto presidencial, para apoiar logisticamente todas as atividades destinadas à consulta popular.
A Instituição Armada passou a ser alvo de forte pressão por parte de diferentes setores, que exigiam que a mesma não aceitasse participar de uma atividade claramente inconstitucional. As pressões não eram sem razão, uma vez que, por lei, as Forças Armadas são garantes da Constituição.
Artigo 272: “As Forças Armadas de Honduras são uma instituição nacional, de caráter permanente, essencialmente profissional, apolítica, obediente e não-deliberante”.
“Se constituem para defender a integridade territorial e a soberania da República, manter a paz, a ordem pública, o império da Constituição, os princípios de livre sufrágio e a alternabilidade no exercício da presidência da República”. (grifo do autor)
Além disso, o mutismo da Instituição a respeito da ordem recebida, associada às conhecidas boas relações que a Junta de Comandantes mantinha com o presidente, gerou um clima de desconfiança a respeito do posicionamento das Forças Armadas em relação à ordem recebida.
O Ministro da Presidência, Enrique Flores Lanza, negava-se a dizer quando seria publicado em Diário Oficial o novo decreto (PCM-019-2009), para que o mesmo se convertesse em lei de cumprimento obrigatório. Por outro lado, assegurava que enquanto isso não ocorresse, as instituições do Poder Executivo deveriam obedecê-lo, “em razão de se estar em um regime presidencialista”.
Na noite de 24 de junho, fortemente pressionado, o Chefe do Estado-Maior Conjunto, General de Divisão Romeo Orlando Vásquez Velásquez, comunicou ao presidente da República que, por impedimento judicial, as Forças Armadas não poderiam apoiar logisticamente a pesquisa popular.
Às 21h 55min, Zelaya, em cadeia de rádio e televisão, anunciou a destituição do Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas e a aceitação da renúncia do Ministro da Defesa. O Ministro Orellana, apesar de dileto amigo de Zelaya, já havia se convencido sobre a ilegalidade da consulta. Em solidariedade ao General Vásquez, os três comandantes de Força - Exército, Marinha e Aeronáutica – renunciaram aos seus comandos.
No mesmo pronunciamento, o presidente convocou sua base de apoio, conformada por movimentos sociais, a uma reunião na Casa Presidencial, às 12:00 de 25 de junho, para, de acordo com suas palavras, “definir os novos rumos democráticos a serem seguidos pelo país”.
O conflito entre os poderes do Estado se extremou. Baseado no artigo 323 da Constituição, a Corte Suprema de Justiça reintegrou o General Vasquez na manhã de 25 de junho.
ARTIGO 323.- “os funcionários são depositários da autoridade, responsáveis legalmente por sua conduta oficial, sujeitos a lei e jamais superiores a ela. Nenhum funcionário ou empregado, civil o militar, está obrigado a cumprir ordens ilegais ou que impliquem a execução de delito”. (grifo do autor)
O dia 25 de junho de 2009 foi um dia intenso. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também resolveu declarar ilegal a pesquisa de opinião político-eleitoral convocada pelo Poder Executivo para o domingo 28 de junho, por violar o que estabelece a Constituição da República.
Nesse mesmo dia, magistrados do TSE e integrantes do Ministério Público apreenderam o material destinado à consulta, que havia sido trazido da Venezuela, e encontrava-se armazenado em um galpão dentro da Base Aérea Hernan Costa Mejia. Na oportunidade, o Coronel Castillo Brown, Chefe do Estado-Maior Aéreo, foi nomeado fiel depositário do material apreendido, o qual permaneceu nas instalações da base.
Por volta das 15 horas, o presidente da República, liderando uma turba de seus seguidores, desconhecendo completamente as resoluções da Justiça e abusando de sua autoridade, assaltou as instalações da Força Aérea e recuperou o material destinado à consulta popular. Na ocasião, expressou publicamente que não iria respeitar decisões do Poder Judiciário, que o Poder Legislativo não representava o povo, mas sim ele, que havia sido eleito presidente de Honduras.
Finalmente, às 24:00 horas, o novo Decreto Executivo (PCM-019-2009) foi publicado, sendo divulgado ao público somente no dia 26, por meio de cadeia de rádio e televisão.
Nesse mesmo dia, o Fiscal Geral da República apresentou ante a Corte Suprema de Justiça um requerimento fiscal e solicitou ordem de captura contra Manuel Zelaya Rosales, sob as acusações de conspirar contra a forma de governo, traição à pátria, abuso de autoridade e usurpação de função em prejuízo da administração pública e ao Estado de Honduras.
No dia 27 de junho, às 22:00 horas, a Corte Suprema de Justiça ordenou às Forças Armadas a captura do presidente da República pelos delitos já mencionados e a paralisação da consulta, o que foi realizado na manhã do dia 28.
Às 12 horas do dia 28, por 123 votos contra 5, o Congresso Nacional referendou a decisão da Corte Suprema e empossou Micheletti como o novo presidente constitucional de Honduras.
Cabe ressaltar que a posse de Micheletti, então presidente do Congresso Nacional, deu-se pela ausência do vice-presidente, que havia renunciado meses antes para candidatar-se às eleições presidenciais de novembro.
6. ESCLARECIMENTOS
Acredito que a exposição realizada ainda possa não convencer a muitos que vêem a ação como um típico golpe de Estado. É certo que alguns pontos seguem sem uma justificativa convincente. A decisão de expulsar o ex-presidente do país, enviando-o para Costa Rica, é um deles.
A ordem emitida era clara: capturar Manuel Zelaya e colocá-lo à disposição da justiça para responder pelos delitos que lhe foram imputados. É preciso, no entanto, considerar as conseqüências de manter preso no país um ex-presidente disposto a tudo - como já havia dado mostras dias antes, ao invadir uma instalação militar liderando uma turba - e respaldado por Chávez e seus petrodólares. A questão não pode ser corretamente avaliada se nos distanciarmos da realidade do que é Honduras, um país de instituições ainda frágeis, onde seus agentes são suscetíveis a todo tipo de pressão e coação. Reconheço, no entanto, que, aos olhos de países mais avançados, com democracias e instituições consolidadas, essas argumentações não são suficientes para esgotar o assunto.
Talvez, mas só talvez, os hondurenhos tivessem muito mais a lamentar caso o ex-presidente permanecesse encarcerado em Honduras. A decisão foi tomada no fragor do combate, de comum acordo entre a Junta de Comandantes e o presidente da Corte Suprema. É possível que não tenha sido a mais acertada. Podemos apenas especular. De fato, jamais saberemos.
Como um segundo ponto, ainda se pode argumentar que o presidente não foi julgado por seus crimes e que tampouco foi seguido um desejado processo de “impeachment”. Para tentar explicar esse aspecto, apresento o que consta da Constituição de Honduras, conforme o já citado artigo 239, que me permito repetir para maior clareza.
Artigo 239: “O cidadão que tenha desempenhado a titularidade do Poder Executivo não poderá ser Presidente ou Designado. Aquele que ofender esta disposição ou propuser sua reforma, bem como aqueles que a apóiem direta ou indiretamente, terão cessado de imediato o desempenho de seus respectivos cargos e ficarão inabilitados por dez anos para o exercício de toda função pública”. (grifo do autor)
Observe-se que o artigo fala em intento e também diz “de imediato” – ou, “no mesmo instante”, ou “sem necessidade de abertura de processo”, ou de “impeachment”. De acordo com a interpretação dos juristas hondurenhos, no momento em que Zelaya foi preso e expulso do país ele já não exercia a presidência da República. Encontrava-se em flagrante delito desde que se tomou conhecimento do decreto no dia 26 de junho e por isso “teve cessado de imediato o desempenho de seu respectivo cargo”. Essa interpretação não foi inédita. Semelhante critério foi aplicado contra um presidente do Congresso Nacional deposto na década de 80.
Como um terceiro ponto obscuro, houve uma suposta carta de renúncia que teria sido firmada por Zelaya e apresentada por um deputado ao Congresso Nacional, momentos antes da posse de Micheletti. Para explicá-la, nada tenho a dizer. Poucos a viram e creio que ninguém a analisou. Muito provavelmente seja falsa. Em situações como essa, onde predominam a incerteza e a insegurança, algumas iniciativas individuais são tomadas de forma atabalhoada e em nada contribuem para que a verdade aflore.
7. REFLEXÕES
Resolvi escrever essas linhas diante da minha perplexidade pela unânime e contundente caracterização do que ocorreu em Honduras, por parte da comunidade internacional, como um golpe de Estado. Para alguns, golpe militar de Estado. Ficou muito evidenciada para mim a dicotomia entre as percepções interna e externa de um mesmo processo. Para a totalidade das instituições do Estado de Honduras e, sem nenhuma imprecisão, para a grande maioria da população, não foi golpe, muito menos militar.
Aceito, sem relutância, que possa haver dúvida sobre a legalidade do que ocorreu em Honduras, sobretudo para os que não acompanharam o processo e não estão muito afeitos à legislação interna. Por isso, entendo a veemência com que a comunidade internacional reagiu à cena descrita no parágrafo introdutório. Soluções à ponta de baioneta já não podem mesmo ser toleradas. O que não entendo é o absoluto desprezo da comunidade internacional pelos argumentos que Honduras vem tentando desesperadamente apresentar para justificar suas ações em vistas a salvar sua própria democracia.
Acho que uma grande desordem se estabeleceu em torno dos aspectos que conformam o conceito de democracia. Confunde-se democracia com eleição popular, olvidando-se que o sufrágio não é mais que apenas um dos seus componentes. Fundamental, mas não exclusivo. Diante dessa aceitação, indisfarçáveis ditadores, eleitos pelo povo, sentem-se inatingíveis, acima do bem e do mal, inclusive com licença para delinqüir.
No Brasil, é mais que evidente a dificuldade do Congresso Nacional em caracterizar a Venezuela como um país não-democrático e impedir sua incorporação ao MERCOSUL. A argumentação não foge ao roteiro: o ex-golpista está regenerado, foi eleito pelo povo. Valendo-se do mesmo raciocínio, o governo não vê grandes problemas em estreitar relações com o Irã, afinal, conforme asseverou Lula, Ahmadinejad foi eleito pelo povo em “eleições limpas”.
A confusão não para por aí. Recentemente, a Organização dos Estados Americanos (OEA) não viu a Carta Democrática como um obstáculo à reabilitação de Cuba, mas valeu-se deste mesmo documento para suspender Honduras dos seus quadros. Quando governadores da oposição de Chávez encontraram-se com o Secretario Geral para denunciar os abusos do presidente venezuelano contra a democracia, receberam como resposta que pouco se poderia fazer, pois a OEA era respeitosa da soberania dos Estados e atenta ao princípio da não-intervenção.
Confusões a parte, as relações internacionais seguem sendo governadas pelo pragmatismo e, no fim das contas, o que se pretende mesmo é preservar o “status quo”. Assim, por que importaria a soberania ou a autodeterminação de Honduras?. Para que ouvir a argumentação da sua gente? Afinal, Zelaya não foi eleito pelo povo?