“O governo é como um bebê. Um canal alimentício com grande apetite num extremo e nenhum sentido de responsabilidade no outro”.
(Ronald Reagan)
Malgrado um certo consenso da opinião pública, pelo menos fora das hostes “bolivarianas”, acerca da necessidade de reformas estruturais que visem à redução do tamanho do Estado e à modernização institucional do país, nossa caminhada tem sido justamente no sentido oposto. Esta disparidade entre o desejo da sociedade e a efetiva ação político-administrativa tem variadas causas.
A primeira está relacionada àquilo que chamo de crescimento por inércia do poder público. Toda vez que o governo assume uma determinada função ou atividade, surgem, imediatamente, interesses corporativistas que passam a trabalhar pela sua perpetuação e expansão. Por isso, qualquer iniciativa que vise a diminuir o tamanho do Estado irá confrontar forças internas muito poderosas, pois é o próprio Estado, como instituição, quem deve limitar-se a si mesmo. São seus próprios agentes que devem encontrar os caminhos para reduzir os respectivos poderes. É fácil intuir que a tendência natural será justamente a inversa, visto que todo funcionário público estará propenso a atuar guiado, antes de tudo, por interesses individuais, tanto quanto qualquer ser humano normal. Nenhum político, chefe de repartição ou dirigente de empresa pública buscaria, deliberadamente, a redução do seu poder. Portanto, toda reforma desse tipo tropeçará no “paradoxo do auto-sacrifício”, já que os encarregados da sua execução serão os menos interessados na sua eficácia.
Outro fator a considerar como obstáculo para qualquer reforma estrutural do Estado tem a ver com percepções, idéias e crenças, que exercem um papel decisivo na formação da opinião pública e, conseqüentemente, na ação dos governos. Como se sabe, as decisões políticas não são pautadas somente pelos fatos e pelas avaliações racionais, mas também, senão principalmente , pelas paixões, mitos e fantasias coletivas.
No Brasil, o Estado transformou-se num semi-deus, dotado de poderes quase divinos para solucionar todos os nossos problemas. Essa perversa cognição da realidade foi capaz de converter o verdadeiro algoz em benfeitor, sobre o qual são colocadas todas as esperanças e devoções. Não importa quão ineficiente, corrupto e perdulário ele se mostre, o cidadão comum (e desinformado) estará sempre disposto a perdoá-lo, desde que lhe acenem com os corriqueiros chavões e palavras de ordem, tais como “o resgate da cidadania, o fim das desigualdades, a justiça ou a inclusão social”.
(De fato, se me permitem uma digressão, a opinião pública brasileira sofre de uma doença rara, um verdadeiro irracionalismo. Reclamam dos altos impostos mas, ao mesmo tempo, continuam clamando por mais e mais ação dos governos. Basta abrir um jornal brasileiro, qualquer que seja o dia, para nos depararmos com exemplos fartos desse paradoxo. A maioria age como se fosse possível comer uma suculenta picanha sem matar o boi. Acham possível fazer poupança, sem alterar o consumo).
Se, pelo menos, a receita extra, extraída dos contribuintes, ano após ano, fosse utilizada para resgatar parte da dívida pública, ainda valeria o sacrifício. O problema é que isto não vem acontecendo, muito pelo contrário. E o pior é saber que o dinheiro nem mesmo está sendo utilizado em investimentos de infra-estrutura, mas essencialmente nos gastos correntes de manutenção da própria burocracia. Só para se ter uma idéia do disparate, reproduzo abaixo um trecho de reportagem recente da Revista Exame, que bem demonstra a balbúrdia fiscal a que estamos submetidos e a completa incúria dos nossos governantes com o dinheiro alheio:
“A despesa corrente da União tem crescido à média de 0,6% do PIB nos últimos cinco anos - ou seja, cerca de 14 bilhões de reais. O inchaço da máquina pública continua desenfreado. Nos últimos cinco anos, as despesas da União cresceram 53 bilhões de reais somente com a admissão de 94 000 funcionários. É uma média de 11 bilhões de reais por ano de elevação de gastos fixos. Para o ano que vem, está previsto que as repartições federais serão lotadas com a contratação de mais 56 000 servidores, a um custo fixo adicional de 3,5 bilhões de reais por ano. Somando-se apenas esses valores referentes ao aumento do quadro de pessoal, chega-se a 14 bilhões de reais, mais de um terço do que se pretende arrecadar com a CPMF no próximo ano. Trata-se de um gasto particularmente daninho, pois os salários e as futuras aposentadorias provavelmente pesarão por décadas à frente.
Além disso, a inventividade do governo para criar novas formas de torrar o dinheiro subtraído dos contribuintes não tem limites. Para ficar em alguns exemplos, neste ano foi anunciada a criação da TV Brasil, uma emissora estatal, a um custo inicial de 350 milhões de reais. Outra novidade é a Secretaria de Planejamento de Longo Prazo da Presidência da República, com status de ministério e despesa de 44 milhões de reais por ano. Em 2007, até a comemoração do Sete de Setembro foi inflacionada. Custou 800 000 reais a mais que o desfile do ano passado”.
Como também dizia Ronald Reagan, a arrecadação de impostos gera as suas próprias despesas. É inútil pensar que os governos irão, de livre e espontânea vontade, trabalhar para reduzir os seus gastos, pois isso não é, como vimos acima, da sua natureza. A maneira mais eficaz, portanto, de que dispõe a sociedade para forçar a ação do Estado nesse sentido é cortar-lhe o financiamento, obrigando-o a encolher-se, não por opção, mas exatamente pela falta dela.
Por isso, a extinção da CPMF é uma oportunidade única que a sociedade tem para - através da pressão e da cobrança cívicas sobre os seus representantes no Congresso Nacional - forçar o governo a iniciar uma dieta ou, pelo menos, parar com a comilança (gastança) desenfreada e irresponsável que acabará nos matando a todos. Não é muito, mas já seria um bom começo. [*]
por João Luiz Mauad em 28 de setembro de 2007
© 2007 MidiaSemMascara.org
[*] Nota Redação MSM: este artigo já estava escrito antes da decisão da Câmara de prorrogar a cobrança do imposto e demonstrar, mais uma vez, que o cidadão contribuinte é a última de suas prioridades.
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